A SOLIDEZ DA MEMÓRIA
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O incêndio que levou ao chão o Museu Nacional, na cidade do Rio de Janeiro, em 2018, foi sem sombra de dúvidas um dos maiores desastres culturais que o Brasil já viu acontecer. As perdas que a tragédia contabilizou são irreparáveis e revelam o descaso para com a ciência, a arte e a história do país.

No meio de todo o luto que envolve a perda de parte do patrimônio do museu, é, mais do que nunca, preciso mostrar que, embora tenha sofrido mais um duro golpe, a cultura brasileira precisa sobreviver. E, mais do que isso: o museu nacional mostra que precisa viver. E, metamorfoseado, ele renasce.

Pensando nisso, esse projeto foi constituído a partir da ideia de que, mesmo sob uma nova casca, o Museu Nacional pode existir a partir do resgate da essência que sempre teve. Essência, aliás, é o termo que Juhani Pallasmaa usa para definir as "experiências tocantes da arquitetura", que "surgem de memórias e significados bioculturais secretos e pré-conscientes, em vez de uma estética puramente visual." O novo espaço do museu procura sempre relembrar às pessoas tanto da tragédia e de sua destruição quanto da possibilidade da sua reconstrução e da preservação de sua memória. A brutalidade das paredes de pedra, estruturadas modularmente através de gabiões, contrasta com os espaços de luz proporcionados pela translucidez que a sua pele de policarbonato os proporciona. O passeio em seu interior é uma constante memória da tragédia e da sua reexistência: a dualidade entre ruína e futuro.
Essa atmosfera de luz nas áreas expositivas é criada com uma estrutura metálica de fácil montagem e manutenção, assim como todos os espaços do novo museu. Os módulos de acervo e manutenção foram pensados a partir de uma estrutura de montagem seca com paredes de drywall, que relembra a capacidade que a contemporaniedade tem de, com pesquisa e tecnologia, fazer com que o museu ainda viva. As estruturas das salas de aula são compostas, assim como o espaço expositivo, com gabiões e estrutura metálica, fazendo com que a memória da tragédia esteja sempre presente.

A volumetria desse novo espaço foi pensada baseada nos espaços do antigo museu. Partindo do conceito de que a memória arquitetônica se dá sempre em fragmentos, sua modulação foi ancorada na criação de formas que buscassem fazer com que as pessoas sempre se lembrem de como era e como sempre será o Museu Nacional. O percurso pela área expositiva é uma recriação da dualidade entre suas grandes salas expositivas e áreas de reflexão e de memória. Da mesma forma, pátios internos foram criados em referência aos pátios que já existiam, sendo que aquele criado na área expositiva remete ao pátio da escadaria, também acometido pela tragédia. As aberturas do foyer recriam a memória da entrada do museu com sua vista ao pátio da exposição. Espaço esse que possui, ao fim de seu trajeto, um mirante com vista ao sítio do museu.

O novo espaço proposto para o Museu Nacional busca fazer uma constante associação entre memória e futuro; entre ruína e arquitetura; entre morte e vida. Lembrar de uma tragédia é preciso para que a história não se apague porque não pode se repetir. A forma do novo museu é pesada porque está de luto; é ruína porque sua cicatriz não se apaga e é luz porque renasceu.
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